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sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Crônica minha (10)

Nomes que condicionam o salário

José Antônio Silva

Na lista de empregados de uma grande empresa, ao correr dos olhos, encontrei em seqüência as seguintes e certamente exemplares funcionárias: Loeci, Loezi, Loici, Loide e, para completar o simpático grupinho, a Loiraci.

Loeci, Loezi e Loici, certamente são variações sobre o mesmo tema. Só não me perguntem que tema é esse. O nome Loide, se sua proprietária for bem jovem, pode ser até uma homenagem dos pais àquela divertida comédia cinematográfica: “Débi e Loide”.

Por mais inteligente que Loide seja, talvez só ela saiba avaliar as brincadeiras e gozações que já teve – e tem – que agüentar, ostentando este nome. Ele pode ser inspirado também em alguma empresa de aviação - para voar cada vez mais alto na viagem da vida... É Loide e tudo bem: só não pode ser molóide!

Loiraci é daquele tipo de nome que já entrega as características físicas da sua portadora: Loiraci deve ser ou ter sido uma linda loirinha. Loira sim, Loiraci!

“Nome de pobre”
Mudando um pouco de enfoque, vale lembrar que é aparentemente inesgotável a capacidade popular para fugir do que chamam de “nomes de pobre”. Você sabe: João, José, Daniel, Pedro, Antonio, Carlos, Manoel, Tiago, Eduardo, Eliane, Maria, Lúcia, Helena, Joana, Laura, Carla, etc e tal. Quer dizer: os tradicionais nomes de tradição ibérica e/ou bíblica, ou de outros origens étnicas, mas que configuram nossa cultura há séculos e milênios.

Revolta popular
Há algumas gerações atrás – digamos lá pelos anos 50 e 60 do século passado, ou até mais recentemente - já tinha acontecido uma grande revolta popular contra os nomes tradicionais, comuns. A solução encontrada para fugir da mesmice era misturar uma parte do nome do pai com uma da mãe. Chacoalhando bem, podia dar certo. Um exemplo do futebol: o craque vermelhinho Nilmar, se não me engano, é o resultado brilhante do amor do seu Nildo e da dona Maria. Ou algo assim. E é um nome que também não chega a comprometer fora de campo.

Hoje, ou há algumas décadas, vivemos num mundo de jovens (e não tão jovens) Maikons, Dijenifers e assemelhados. O ponto em comum é que costumam ser corruptelas – grafadas das mais variadas e delirantes formas – de nomes ingleses, confirmando que quem domina o mundo, militar e economicamente, impõe ao mesmo tempo seu idioma, como acontece pelo menos desde o império romano e o seu respectivo latim (e apesar da grave crise americana atual, nada indica que, em essência, esta situação vá mudar tão cedo).

Registro em cartório
Edição da Folha de S. Paulo, de alguns anos atrás, trazia reportagem sobre cartórios de registro, na interminável periferia paulistana, em cujas paredes figuram todas as possíveis formas de escrever os nomes prediletos dos atuais papais e mamães: Taysson, Thaiçon, Theissom; Deiviçon, Dheyvidsom, e por aí vai.... Os progenitores do recém nascido só tinham que apontar qual a grafia – quanto mais diferente, melhor – para seu garotão ou sua fofinha.

Voltemos ao esporte bretão: os nomes dos atuais jogadores de futebol fornecem um bom material de pesquisa. Richarlysson não me deixa mentir sozinho.

Reforma Ortográfica
E mais: a atual Reforma Ortográfica da Língua Portuguesa, querendo ou não, restabeleceu o status de letras como Y, W, K, que eram consideradas estrangeiras. Restabeleceu para a chamada “norma culta” – a vontade popular há muito tempo tinha descoberta nestas letras um passaporte para tentar enganar a pobreza e a origem humilde.

Vamos reconhecer: infelizmente, trata-se apenas de uma tentativa. E quase sempre fracassada. Da classe média para cima, os nomes seguem o padrão “clássico” do idioma: Carolinas, Dianas (não Dahyannas), Isabéis, Ricardos, Claudios, Ciros, Guilhermes, Diegos e Diogos, etc.

Sobrenomes
Na verdade, mais que os nomes, o que conta mesmo quase sempre são os sobrenomes importantes (antigos ou de novos ricos), constituindo uma aristocracia crioula - que segue mandando e desmandando, concentrando renda e pagando salário mínimo e eventuais gorjetas para os Deiwysons e Karollainnes desta nossa vidinha brasileira.

Como dizem os místicos e os neurolingüiças, digo, lingüistas, há nomes que condicionam destinos. E salários, eu acrescentaria.

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