A velha MPG volta à cena, em grande
e rápida aparição
José Antônio Silva
Em todos os sentidos grande, o
show dos 30 anos da MPG no Salão de Atos da UFRGS, nesta terça-feira, 10 de
julho de 2012, consolidou uma relação antiga e reaproximou compositores e músicos
com seu público. Um público fiel há décadas, além dos jovens que viam e ouviam
aquilo tudo com surpresa e, alguns, com o entusiasmo da descoberta.
Mas, além de renovar a
percepção de tantos talentos (dos veteranos e dos novos que se apresentaram), o
espetáculo – realizado no limite da improvisação, compensada pelo entusiasmo e
a boa vontade geral – trouxe surpresas. Como a presença da gaudéria Berenice
Azambuja, que botou todo mundo a bater palmas no seu ritmo e cantar tudo aquilo
que o velho gosta – em meio a tantas melodias e letras sofisticadas da Música
Popular Gaúcha.
Outra constatação foi que – definitivamente
– arte de qualidade não tem nada a ver com bons sentimentos e lições
edificantes. Demonstração límpida dessa verdade veio com Mauro Kwitko. Ao
cantar a densa e marcante “Mal necessário” (gravada por Nei Matogrosso), ele
relembrou a força perturbadora de seu talento. Ao complementar sua apresentação
com uma musiquinha de amor à natureza, com pegada semi-infantil e didática, o
compositor fez desabar o termômetro artístico e emocional da platéia ao nível
do chão.
Nada que comprometesse. O tom
geral foi de reencontro do público com seus antigos ídolos. E dos próprios
artistas entre si, três décadas depois que o produtor Ayrton dos Anjos, o
“Patinete”, levou um grupo de compositores gaúchos a se apresentarem no Teatro
João Caetano, no Rio (e lá cunhou a expressão “MPG” para classificar o que o
público carioca iria ver e ouvir). Dos que lá estiveram, faltou Jerônimo
Jardim. Os já falecidos foram relembrados em imagens, palavras de saudade e
vídeos, como Carlinhos Hartlieb, Galileu Arruda e Geraldo Flach.
Nelson Coelho de Castro, Peri
Souza, Gelson Oliveira, Zé Caradípia, Nando Gross, Hermes Aquino (eufórico após
anos de afastamento dos palcos) e outros artistas da época mostraram canções –
quase sempre os maiores sucessos de suas carreiras. A apresentação final ficou
por conta de Bebeto Alves, saudado pelo apresentador Roger Lerina como um
nome-síntese de toda a movimentação da MPG desde os anos 70.
Mas quem mais arrebatou o
público, com direito à lágrimas no palco e na platéia, foi Raul Ellwanger, que
a custo conseguiu cantar, tal a sua emoção – e que ao final de “Pialo de
Sangue” foi aplaudido de pé.
Juarez Fonseca, o outro
apresentador do show – cerca de quatro horas de duração – de início havia feito
uma contextualização dos principais fatos do Brasil e do mundo em 1982. Ele
lembrou alguns momentos marcantes da evolução da produção dos compositores
urbanos do Rio Grande do Sul, com um pé na tradição (e/ou no tradicionalismo) e
a cabeça no Brasil e no mundo. E citou o seminal LP “Paralelo 30” , de 1978 (produzido por ele
mesmo), entre outros discos marcantes, como “Juntos”, de 1981.
Muitos outros artistas que
não estiveram no show de 1982 mas fazem parte da mesma movimentação (embora a
diferença de gerações), como Nei Lisboa, Hique Gomes, Nico Nicolaiewski, Giba
Giba, Almôndegas, Kleiton e Kledir, Cláudio Levitan, Maria Lúcia, Jerônimo
Jardim, Totonho Villeroy, Loma, e tantos mais, não destoariam do clima no palco
da Reitoria – embora, neste caso, fosse necessário fazer um festival com mais
de um dia de duração. Em todo caso, assistiam a tudo, discretos na platéia,
nomes importantes como Wanderley Falkenberg e João de Almeida Neto (este representando
o lado rural da música gaúcha).
No embalo da apresentação, gente
que nunca abre a boca – como o mestre da batida Fernando do Ó – sentiu a emoção
do momento e emocionou também o público, ao pedir a palavra. Do Ó revelou a sua
saudade de Geraldo Flach e que foi o falecido compositor e pianista quem o
lançou como percussionista – até então, era guitarrista.
Apesar do tom de grande
improviso, o show na UFRGS também deixou espaço para uma série de artistas mais
(ou menos) recentes, de Marcelo Delacroix à Adriana Defenti e os grupos Fruet e
os Cozinheiros e Cidade Baixa, que mostraram grande talento, lançando à frente
a tal linha evolutiva da MPG. Enfim, para fazer mais, só mesmo um festival da
música popular gaúcha, com mais de um dia de duração. Ou “música popular
gaúcha”, nos dias atuais, já não faz muito sentido?
2 comentários:
Que pena eu não ter estado lá.
Que bom este relato.
Verdade, Clovis, quem tem de 45 anos pra cima (ou até menos) curtiu muito essa agitação toda. E pra gurizada que tava lá, eu vi que era uma sensação de descoberta...
Abraço e obrigado!
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