Alô! Não, não. Foi engano...
José Antônio Silva
Claro, claro, o celular é maravilhoso, etc. etc., muito útil, etc. etc., pode salvar uma vida, etc. etc. – mas, assim como o cigarro, deve ser urgentemente proibido em lugares públicos. E quando digo lugares públicos, incluo aí salas de espera, ônibus e outros locais que você não pode abandonar imediatamente sem sofrer prejuízos. Afinal, quem agüenta sujeitos fechando negócios e discutindo longamente preços de pneus usados ao seu lado no coletivo, em altos brados?
E será que não daria pra preservar ao menos os ouvidos desinteressados pelos detalhes íntimos da vida dos conhecidos - quanto mais dos absolutamente desconhecidos? Mais ou menos assim (e ainda bem que você só escuta a metade do diálogo):
- Ele o quêêêêê? Te... assim?
- ...........
- Não acredito....
- ...........
- ... e...e....doeu?
- ...........
- Ai, amiga....
- ................
- E você não tinha levado?
- .............
- E agora?
- ............
- Ah.... marcaram de novo....
- ..........
- Você vai levar aquele roxinho?
- ........
- Ah, o verde....
- ..........
- Tua mãe desconfiou?
Claro, claro, bobagem minha. Esse aparelhinho nos faz aprofundar ainda mais nosso conhecimento da natureza humana – queiramos ou não.
- Não vai pagar?!
- ............
- Eu já paguei No mês passado! E no anterior também!!
- ............
- O quê??? Mas é... tu tá brincando comigo, né??
- .............
- Vai tu, vagabundo!
- ...........
- É vagabundo sim!
- ...........
- Tu nunca te coça.... E aquele cartão que eu paguei pra ti?!
- ...........
- Não, não! Nunca, nunca!....
Claro, claro, o celular é tudo de bom – além das fotos, dos torpedos, dos e-mails, do GPS, dos ringtones e milhões de outras coisas tão incríveis e divertidas: dá até para comparar os portables atuais com os velhos canivetes suíços de mil lâminas e utilidades incríveis, caso você esteja perdido na floresta amazônica sem mini saca-rolha, tesourinha ou lixa de unhas...
Claro, claro, tudo bem, é uma invenção maravilhosa. Mas assim como proibiram o cigarro em ambientes públicos, nada impede que façam o mesmo com o celular. Até porque, pesquisas que todo mundo já tratou de esquecer afirmavam que ele também pode causar câncer, novamente que nem o cigarro.
- Alô? Me processar? Não, foi engano, foi engano. Não foi deste aparelho!
3 comentários:
José Antonio!
Perfeito, é bem isso!
Abraços,
Cristina Macedo
Gostei. Às vezes, tenho vontade de arrancar o celular das mãos de alguns e jogar por qualquer janela (cão raivoso), no livro "O segundo diário mínimo", do Umberto Eco também tem um texto falande de quem deveria ou não usar celular. Abraços. Jorge Fróes
Pô Zé!
Como assim? Tu, que és escritor não estás interessado nos detalhes da vida íntima de desconhecidos? Não desprezes esse rico filão...
A Dedé Ribeiro se inspirava em trechos de conversa entreouvidos ao acaso para criar minicontos > http://micro-dramas.blogspot.com/
Tem é que liberar o cigarro...
Abraço!
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