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sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Conto um Conto

Penavento na rota


José Antônio Silva


- Me vou ao Leste - disse Penavento.

Farafiel baixou a cabeça discordando, mudo.

- Diz que lá o mar bate nas botas... – voltou Penavento.

- Diz quem quer dizer – Farafiel escutou a própria voz.

- … e que as mulheres são dadas e têm a cabeleira solta – tornou Penavento.

- As nossas também podem soltar. Podem se soltar E se soltam, às vezes.

- E que os peixes vêm comer na mão.

- Não gosto desses bichos esquisitos.

- E que chove quando precisa.

- Às vezes, demais – Farafiel fez questão de registrar.

- Tem coisas que não dá, dependendo. Mas quase toda semente vinga.

- Só que por aqui cresce mais.

- Frio, aqui nestas bandas. Cansa.

- Tá te entregando, Penavento?

- Nosso frio mata.

- O deles também. E as águas que batem na bota são salobras. E sobem pela barranca.

- Tem bons cavalos lá. Vi um tobiano que...

- … te apresento trezentos tobianos especiais, sem ir muito longe.

- Aquelas galegas têm olho de bolita azul...

- Nossas morochas têm preto, marrom, verdinho e até azul, igual. E até já parei num olhar violeta, na subida, outro dia. Se me acreditas.

- Dá pra andar de manga curta.

- Esqueceste da canícula nossa?!

- Nossa? Tua! Eu me vou ao Leste, Farafiel.

- Nossa terra é mais bonita – murmurou o outro.

- Já não vejo beleza.

- Outras vão aparecer... Laís me indagou de ti... E aquela pode repensar.

- Pode pensar, repensar, desaparecer se quiser. Aqui, ainda faço uma loucura.

- Ah.... Bueno... Te empresto o dinheiro do trem, então.

- Eu me viro por aí.

- Mas volta!

- Nunca mais te vejo, Farafiel.

- É muito tempo, este nunca, Penavento.

- Tempo é só o que eu tenho agora. De sobra. Mas quem sabe...

- Vais perder o trem.

- Estás com pressa de me ver pelas costas?

- Mas se tu é que queres ir...

- Verdade. Querendo ou não querendo, eu quero.

- Não. Não querendo, não precisa. E a Rosa me disse que …

- O trem! Vem chegando. Até um dia.

- Esqueces do chapéu, Penavento!

- Fica com ele, Farafiel. Lá, diz que ninguém usa mesmo.

- Será? Que gente. Mas e tu?

- Adeus!

- Assim? E... e a mana?

- Adeus e me fui!

- Ah! Vou ser obrigado.




2 comentários:

Ernesto Perez Castillo disse...

querido jose, aqui me tienes de visita en tu blog, disfrutando lo que escribes. muchas gracias por la invitacion. un abarzo.

José Antônio Silva disse...

Gracias, Ernesto.
Espero que hagas nuevas visitas.
Mi abrazo a ti y a todo el pueblo de Cuba.