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terça-feira, 17 de agosto de 2010

Cultura





MPB acendeu luz na noite da ditadura

José Antônio Silva

A longa noite da ditadura no Brasil, a partir de 1964, também acendeu alguns pontos de luz na cultura brasileira, muito especialmente na tal de MPB. Dia desses assisti ao documentário “Uma noite em 67”, dos bons estreantes Renato Terra e Ricardo Calil, que põe em foco não só o palco do histórico 3º Festival de MPB da TV Record, em outubro de 1967, com suas canções top de linha, mas também os bastidores. E é nos bastidores, nas revelações e confissões dos jovens e ingênuos futuros medalhões da música brasileira – Gil (na foto acima), Caetano, Chico, Edu Lobo, Roberto Carlos, etc – que reside o diferencial.

Parada duríssima

As seis classificadas já eram, por si mesmas, ícones da canção popular do país, que só ganhariam mais significação nos anos que se seguiram. Quem venceu foi “Ponteio”, do Edu Lobo; e era uma excelente música. Mas quem reclamaria, hoje, se, ao invés, tivesse ganho “Alegria, Alegre”, do Cae, “Construção”, do Chico Buarque, ou “Domingo no parque”, de Gil? Parada duríssima, não é mesmo? Entre as outras classificadas, “Maria, carnaval e cinzas” (de Luiz Carlos Paraná, cantada pelo Rei da Jovem Guarda, Roberto Carlos, só pra mostrar que à época já era um craque da interpretação, inclusive no samba). Em sexto, ficou “Beto Bom de Bola”, de e com Sérgio Ricardo – mais conhecida pela vaia de um público deslumbrado pela própria liberdade (pelo menos aquela!) de vaiar, e pelo violão que o autor jogou na platéia, do que pela canção mesmo.

Falar em vaia e festival, vale citar o discurso em alta voltagem de Caetano, na edição seguinte do mesmo Festival – no paradigmático ano de 68 – em que ele desanca o público que o vaiou ao cantar “É proibido proibir”, vestido com um traje tropicalista (no ano anterior, ainda envergara um comportado bleiser quadriculado sobre uma blusa de gola rolê). “Se vocês forem em política como são em estética, estamos feitos”, mandou para o público histérico. E sobrou para os jurados: “O júri é muito simpático, mas incompetente!”.

Protesto!

E corta pra outro assunto, mesmo ficando na mesma praia. Voltando à primeira frase desse texto, pode-se pinçar no repertório clássico da MPB entre 1964 e 1985, entre várias outras opções, várias canções “de protesto”, explícitas ou implícitas, contra a ditadura militar, o autoritarismo, a esperança em novos dias. Toca aí, algumas:

“Para não dizer que não falei de flores” (Geraldo Vandré); “Vai passar” (Chico Buarque); “Apesar de você” (Chico Buarque); “Meu caro amigo" (Chico e Francis Hime); "Eterno Aprendiz" (Gonzaguinha); “O bêbado e o equilibrista”, "Não põe corda no meu bloco" (João Bosco e Aldir Blanc); “Disparada” (Vandré e Theo de Barros); “Cálice” (Chico e Milton Nascimento); “Tropicália” e “É proibido proibir” (Caetano), “Procissão” (Gilberto Gil); "Charles Anjo 45" (Jorgen Ben); "Cartomante" (Ivan Lins e Vitor Martins); “Mosca na sopa” e “Ouro de tolo” (Raul Seixas); “À palo seco”, “Apenas um rapaz latino-americano”, “Como nossos pais” (Belchior); “Pialo de sangue” (Raul Elwanger); “Aquele tempo do Julinho” (Nelson Coelho de Castro); “Admirável gado novo” (Zé Ramalho); e etc, etc...

E quem quiser que conte outra.


Um comentário:

Lengo D'Noronha disse...

E os'sertanejos universitários', os 'fake funk' e outras inonimáveis coisas que insistem em chamar de música vieram pra fazer o apagão geral.